O pacto entre o lulopetismo e o STF para converter o Brasil em pária internacional

Em artigo publicado nesta Gazeta em 6/11/2024, dia seguinte à eleição de Donald Trump, manifestei a expectativa de que as relações bilaterais entre Brasil e Estados Unidos atingiriam seu ponto histórico mais baixo em 2025 e 2026, em razão, sobretudo, da possibilidade de sanções contra autoridades dos Poderes Executivo e Judiciário brasileiros.

Como bem se sabe, ambos têm, desde 2023, se coordenado para, dentre outras medidas liberticidas e ilegais, cercear a liberdade de expressão em plataformas digitais, com consequências que extrapolam o território brasileiro e afetam indivíduos nos EUA e em outros países.

À época, no entanto, avaliei que, embora autoridades do Poder Executivo brasileiro pudessem ser afetadas por sanções, elas não tomariam a frente da defesa dos integrantes do Judiciário que, por simples autoria, sempre despontaram como os primeiros passíveis de serem sancionados pelo governo dos Estados Unidos.

O governo Lula, acreditei, buscaria – em um raro lampejo de lucidez, em vista de seus escassos recursos de poder diplomáticos e militares – se preservar, ensejando uma defesa tímida das autoridades judiciárias sancionadas e buscando, possivelmente sem muita expectativa de êxito, construir pontes em níveis intermediários com a equipe de Donald Trump. Ou seja, a ideia seria não escalar o conflito, de forma a não transformar sanções contra indivíduos em um litígio entre estados.

A declaração do Secretário de Estado Marco Rubio, proferida em 21/5, no contexto de audiência da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Representantes (Câmara Baixa) do Congresso dos EUA, segundo a qual o governo dos Estados Unidos provavelmente aplicarão sanções correspondentes à Lei Magnitsky contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), não surpreende, pois ela representa, de certo modo, o corolário do diligente trabalho liderado pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL/SP) junto ao governo e ao Congresso dos Estados Unidos.

Desde fevereiro nos EUA e licenciado de seu cargo, o parlamentar tem atuado com vistas a expor às autoridades daquele país – e ao mundo – o padrão contínuo de arbitrariedades, medidas liberticidas e atropelos legais observado pelo ministro Moraes, com o óbvio concurso da maior parte de seus pares e com a assistência do governo federal, seja por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), da Procuradoria Geral da República (PGR), do Itamaraty e de outras instituições de Estado que foram tristemente convertidas em agências de repressão e de propaganda do lulopetismo.

Não me ocorreu, contudo, por extrema irrazoabilidade, que, na iminência do anúncio de sanções que deverão transformar (pelo menos) o ministro Alexandre de Moraes em um pária civil em praticamente todos os países do mundo (à exceção de China, Rússia e seus estados-clientes de facto), expoentes do governo Lula (e pares de Moraes no STF) resolvessem se antecipar para dizer que medidas contra o ministro serão vistas, pelo Estado brasileiro, como atentatórias à soberania nacional.

Trocando em miúdos: diante da conversão de seu garante ilegal em pária, o governo Lula anunciou que dará “all in” e levará todo o Estado brasileiro à condição de pária, impondo à República as consequências das decisões que foram tomadas por Moraes e endossadas por um governo que decerto não existiria não fossem os préstimos do próprio ministro, de seus pares e do Tribunal Superior Eleitoral não apenas na escandalosa eleição presidencial de 2022, mas também nas sistemáticas medidas utilizadas para dificultar, a todo momento, a gestão do Presidente Jair Bolsonaro.

A decisão de transformar o Brasil em pária indica a leitura existencial que o governo Lula faz de sua relação com o STF, inclusive no que se refere à sua continuidade a partir de 2027: sem o concurso do Supremo e de seu apêndice eleitoral, Lula e seu entourage demonstram estar convencidos de que a direita, liderada por Bolsonaro, logrará uma vitória acachapante na eleição de outubro de 2026.

Permitir que Moraes seja rifado poderia, portanto, gerar consequências que tornariam indispensável à Justiça Eleitoral não favorecer Lula, como fez em 2022, e mais: fazer com que tanto o governo quanto o Congresso dos EUA dediquem alguma atenção tanto à campanha quanto às eleições brasileiras do ano que vem, circunstância que certamente impedirá o consórcio que ora manda no Brasil de repetir a marmelada de 2022.

Tendo o governo e o STF concluído um pacto de defesa mútua ao custo da destruição da República, incumbe ao Congresso Nacional agir com vistas a impedir que essa aliança espúria lance o Brasil em um precipício do qual um futuro governo, liderado por um mandatário responsável e não por um caudilho narcisista com claros indícios de demência senil, terá dificuldades em resgatar.

É o momento de a oposição parlamentar cumprir as funções da qual o Executivo, desidiosamente, se desligou para se dedicar a fazer do governo e do Itamaraty, cuja missão constitucional precípua é assessorar o presidente da República na formulação e na execução da política externa, ferramentas indignas do lulopetismo e suas ramificações.

A continuidade do trabalho liderado por Eduardo Bolsonaro, com o concurso de dezenas de outros parlamentares de oposição – como Filipe Barros (PL/PR), presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados -, junto sobretudo ao governo e ao Congresso dos Estados Unidos, poderá significar a diferença entre o ponto de não-retorno de um processo de venezuelanização institucional e um resgate das liberdades fundamentais similar ao registrado na Argentina desde a eleição de Javier Milei, no fim de 2023.

Para tanto, será preciso contar com apoio externo para impedir que o estado de deterioração das instituições brasileiras progrida até se cristalizar em um regime multigeracional, à maneira do comunismo castrista em Cuba e do bolivarianismo chavista na Venezuela.

Conquanto o principal objetivo dessa diplomacia parlamentar seja o de viabilizar condições para um pleito justo em 2026, capaz de restaurar as liberdades civis básicas no Brasil, sua agência poderá resultar também em reformulação ampla das relações bilaterais entre o País e os Estados Unidos, que, convém reiterar, ora se encontram em seu nível mais baixo desde que foram estabelecidas, em 1824.

A vitória de Trump na eleição de novembro do ano passado, celebrada pelas direitas brasileira e global como um alento no combate à erosão das liberdades civis e da soberania nacional, se nos apresenta não apenas como uma oportunidade, mas talvez também a derradeira, para evitar que o Brasil se converta em um regime sem oposição real, com difusão das forças de um único espectro político, o da esquerda, em agrupamentos fantasiosos, concebidos precisamente para transmitir a ilusão de pluralidade política no contexto de uma juristocracia militante. O País não pode desperdiçá-la.

Marcos Degaut é Doutor em Segurança Internacional, Pesquisador Sênior na University of Central Florida (EUA), ex-Secretário Especial Adjunto de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e Ex-Secretário de Produtos de Defesa do Ministério da Defesa 

noticia por : Gazeta do Povo

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