Fracasse. Fracasse mais. Fracasse melhor

Caro leitor,

Vindo de um fracasso recente, é natural que eu reflita sobre ele: o fracasso. Não com a melancolia de quem desiste, e sim com a curiosidade de quem procura entender o que deu errado – e qual a sua parcela de culpa no erro. Fracassei, mas tentei. Errei mais do que acertei. Vi o quebra-cabeça sobre a mesa e demorei para me dar conta de que a peça que não se encaixava era eu. E tudo bem.

Em pensando no fracasso, me lembrei de um ensaio da escritora Zadie Smith, que fez sucesso no começo do século XXI e hoje sei lá por onde anda. Ela fala sobre o fracasso literário, um fracasso íntimo, no qual é muito fácil se afogar. Mas é facinho adaptar a ideia do “fracasse melhor” a outros campos. No pessoal e no profissional, como diria o Faustão, e inclusive no político, que eu sei que é o único que o interessa. (Infelizmente).

Jogo de cintura

Fracassar melhor não significa evitar o erro. Pelo contrário. Significa tentar, arriscar e, se o fracasso for inevitável (algo que só dá para saber a posteriori), fracassar com mais estilo. Com mais consciência do que o levou ao fracasso. Com mais graça e, aqui e ali, até com certa altivez. Afinal, você ousou, tentou e, por circunstâncias sobre as quais nem sempre se tem o controle e raramente se tem o controle total, fracassou. Fracassou melhor.

E, com alguma sorte, aprendeu. Nos fracassos pessoais, por exemplo, é possível aprender a humildade de se descobrir extremamente imperfeito. Nos profissionais, temos que engolir a realidade de que o talento muitas vezes não compensa a falta de jogo de cintura. E nos políticos… Bom, nos fracassos políticos a gente aprende o que todo mundo sabe: você sempre será o culpado pelo fracasso alheio e o outro sempre será o culpado pelo seu fracasso particular.

Fracassar pior

E, pela segunda vez neste texto, tá tudo bem. Tá tudo certo. Porque fracassar não é o problema. O problema é desistir. Não, não. Minto. O único fracasso real é insistir no fracasso, empobrecendo o estilo e tirando dele a graça e a possível altivez. Reduzindo-o a uma fórmula cujo suposto sucesso é supostamente garantido. Em se tratando de fracasso, o pior que pode lhe acontecer é não reconhecer que fracassou e, por isso, fracassar pior.

Aqui do meu cantinho, este é o mundo que vislumbro: um mundo que tem aversão ao risco, à ousadia e, por consequência, à excelência. Por medo do fracasso que o obrigará a reconhecer suas limitações. Inclusive (e aqui caímos na política novamente) a nossa incapacidade de criarmos um sistema político e econômico perfeito e perfeitamente bem-sucedido. Capisce?

Um só

Por isso encerro a carta de hoje com o mesmo conselho que Zadie Smith dava aos escritores de uma geração literária acomodada e covarde, avessa ao risco e ao fracasso em potencial: fracasse. Fracasse melhor. Fracasse como o sujeito que está escrevendo esta crônica inútil, na crença infundada de que talvez, apenas talvez, ela toque o coração de um leitor. Um só.

Um abraço do
Paulo

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noticia por : Gazeta do Povo

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