IOF em câmbio gera distorções e se opõe às boas práticas

Entre as novas medidas arrecadatórias anunciadas pela Fazenda, está o aumento do IOF sobre algumas operações de câmbio. No caso dos cartões de crédito e débito, a alíquota aumentou para 3,5%. Já a alíquota das remessas de recursos para conta do contribuinte brasileiro no exterior para investimento permaneceu em 1,1%. E, se a operação for uma transferência para aplicação de fundos no exterior, não há incidência de IOF.

Em termos práticos, um imposto que incide de forma distinta em diferentes operações de câmbio acaba por criar múltiplas taxas de câmbio. Custa mais, por dólar, comprar um tênis em viagem internacional do que transferir o mesmo montante de recursos para uma conta de investimento fora, apesar de não haver nenhum motivo para que as operações de câmbio direcionadas para consumo e investimento tenham alíquotas diferentes.

Na transação de bens, o IOF privilegia quem exporta, em detrimento de quem importa, já que o IOF não é cobrado nas operações de câmbio que envolvem exportações. Essa diferenciação gera vantagens competitivas artificiais, o que prejudica o livre-comércio. Para a população local, as possibilidades de consumo ficam reduzidas em razão de preços finais mais elevados, que não refletem a taxa de câmbio verdadeira da economia.

A multiplicidade de taxas gera distorção de preços relativos, influencia as escolhas e decisões das pessoas e das empresas, altera a alocação de recursos e resulta em ineficiências. É nesse sentido que o Brasil assumiu o compromisso de zerar gradualmente as alíquotas de IOF sobre operações de câmbio, em um movimento que se iniciou em 2023 e que seria alcançado em 2029. Mas o aumento recente do IOF com a prevalência de alíquotas diferenciadas acaba de nos reposicionar na direção contrária.

Um regime ordenado e estável das operações cambiais, sem alíquotas diferenciadas, faz parte das boas práticas internacionais e das recomendações feitas aos países-membros da OCDE e do FMI. Ambas as instituições promoveram enormes esforços para eliminar as restrições nos pagamentos e transferências internacionais, estabelecendo princípios de não discriminação, de transparência e de progressiva liberalização nas transações de câmbio.

Como o IOF diferenciado nas operações de câmbio constitui uma restrição ao livre fluxo de capitais, a política nos deixa mais longe de nos tornarmos membros da OCDE. Países-membros se beneficiam da associação de diversas formas. Entre elas, a de dar boas indicações para os investidores nacionais e internacionais de que as políticas do país seguem os principais padrões e as melhores práticas da OCDE em áreas como governança corporativa, combate à corrupção, investimentos, concorrência, mercados financeiros e governança pública.

Com relação ao FMI, do qual o Brasil já é membro, a aplicação de alíquotas diferenciadas de IOF pode ser interpretada como uma forma de câmbio múltiplo. Essa é uma prática proibida aos países-membros, a não ser que justificadas por motivos específicos, como para estabilidade financeira, ou autorizado pelo FMI.

Anunciado logo após a divulgação do resultado fiscal do governo, o aumento do IOF tem claro propósito arrecadatório, apesar de ampla evidência apontar para efeitos limitados do uso de câmbios múltiplos para esse fim. A arrecadação pode até aumentar a curto prazo, mas a política introduz diversas ineficiências na alocação de recursos, além de ser convidativa ao comportamento oportunístico de grupos de interesse para obter vantagens.

A longo prazo, regimes de câmbio múltiplo estão associados a menor crescimento econômico, maior inflação e menores fluxos de comércio e investimentos. Não faz sentido voltar a utilizar o IOF em operações cambiais para fins arrecadatórios.


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noticia por : UOL

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