Mobilidade, insegurança e acesso à universidade

Faz 13 anos que uma jovem de 23 anos foi estuprada e torturada por vários homens em um ônibus em Nova Déli, vindo a falecer duas semanas depois em decorrência dos ferimentos internos. O incidente chocou o mundo e desencadeou uma série de protestos na cidade. A segurança e o tempo no transporte público são questões cruciais, especialmente para as mulheres.

A insegurança e o tempo excessivo no transporte público podem influenciar as decisões de seus usuários. Por exemplo, a melhoria do transporte coletivo pode não apenas ampliar o acesso a melhores oportunidades de emprego, mas também atenuar desigualdades por meio do acesso à educação superior. Se as mulheres são mais afetadas pela falta de segurança, essas melhorias podem ter um impacto ainda mais significativo para elas.

Segundo o estudo da economista Fabiola M. Alba-Vivar (“Opportunity Bound: Transport and Access to College in a Megacity”), foram analisados os efeitos da ampliação do transporte público em Lima, Peru, com a expansão de uma linha de ônibus de acesso rápido e uma nova linha de trem. A intervenção abrangeu áreas com alta concentração de universidades e reduziu o tempo médio de deslocamento dos estudantes, que antes levavam cerca de duas horas. A autora utiliza registros administrativos de matrícula no ensino superior ao longo de 10 anos, em que teve acesso da localização tanto das instituições de ensino superior quanto das residências dos estudantes.

Uma redução de 17% no tempo de transporte resultou em um aumento de 6% nas novas matrículas. Os efeitos foram maiores em bairros que, tipicamente, apresentavam taxas baixas ou nulas de ingresso no ensino superior, o que sugere que esse crescimento está associado à entrada de novos estudantes afetados pela expansão do sistema de transporte. Esse efeito positivo foi impulsionado pelas universidades privadas. Como o trajeto da expansão do sistema de transporte ficou mais próximo dessas instituições do que das públicas, isso provavelmente contribuiu para o resultado observado.

A autora classifica as universidades privadas por qualidade, com base nos retornos no mercado de trabalho. Na amostra utilizada no estudo, considerando os novos estudantes afetados pela expansão, Fabiola encontra que as mulheres têm maior probabilidade de frequentar instituições de menor qualidade do que os homens. Eles, por sua vez, estão dispostos a se deslocar até 55% mais tempo do que as mulheres para cursar em instituições com maiores retornos salariais. Com a inauguração das novas linhas, os homens tendem a evitar faculdades de baixa qualidade, enquanto as mulheres são mais propensas a ingressar nelas.

Esse resultado não é diferente de um estudo publicado por Girija Borker, em 2020, que mostra que, em Nova Déli, áreas com maior risco de assédio podem levar as mulheres a escolher faculdades de menor qualidade quando essas são percebidas como estando em locais mais seguros do que as de melhor qualidade.

Os resultados encontrados por Fabiola chamam a atenção de como o desenho de políticas públicas podem levar a resultados inesperados. No caso da expansão do transporte coletivo, nitidamente uma política pública importante, pode ter impactos diferentes no acesso ao ensino superior como no mercado de trabalho acentuando diferenças de gênero já existentes.


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noticia por : UOL

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